terça-feira, 28 de outubro de 2008

A África nas Relações Internacionais


A reafirmação da África no sistema mundial

As tendências de reafirmação da África no sistema mundial, que se esboçaram na segunda metade dos anos 90, se aprofundaram na passagem do século. Apesar disso, os conflitos étnico-tribais e guerras civis se mantiveram, muitas vezes atingindo níveis de extremos de violência. Esta situação foi mais comum especialmente nos Estados do Golfo da Guiné e da África Ocidental. Este foi o caso da Guiné-Bissau, cuja tentativa de golpe militar em 1998 transformou-se em guerra civil. Na Libéria, os conflitos entre as populações do interior e as mais ocidentalizadas do litoral prosseguiram de forma intermitente e na Serra Leoa, em 1999, o mesmo problema começou a se manifestar com intensidade. As populações do litoral, em grande parte descendentes de ex-escravos retornados das Américas, constituem a elite dirigente, discriminando os nativos. Alguns grupos políticos ou tribos, por outro lado, são financiados pelas grandes companhias de diamantes (particularmente as localizadas em Antuerpia) e outras pedras preciosas, com o objetivo de manter o controle das zonas de mineração, devido ao literal colapso do Estado e a desordem reinante.
Tudo isto agrava as tensões locais e propicia uma espécie de "privatização" da política e da violência armada, em meio a todo o tipo de tráfico, particularmente o de drogas, que tem crescido na África. A Nigéria, por sua vez, é conhecida por possuir uma poderosa máfia de narcotráfico, que já atua em todo o mundo. O fim do regime autoritário neste populoso país africano, por seu turno, não trouxe a esperada estabilidade, muito pelo contrário. Outro país atingido por uma guerra civil, foi a Costa do Marfim, onde os rebeldes apoderaram-se da metade norte do país em 2003, em sua luta contra o governo, tendo sido necessário uma intervenção francesa em apoio do mesmo. Ja as ilhas Comores, independentes desde 1975, teve seu décimo-oitavo golpe de Estado em 28 anos de independência, o que vem reforçar a noção de instabilidade do continente.
Por outro lado, o processo de implantação de numerosas democracias após a queda do Muro de Berlim, impulsionadas de fora para dentro através daquilo que Samuel Huntigton denominou de "Terceira Onda" (a das democracias), parece estar retrocedendo. Antigos lideres de regimes autoritários de esquerda comecaram a voltar ao poder. Com a guerra civil de 1997-1998, Denis Sassou Nguesso voltou ao poder na República Popular do Congo, com apoio da empresa petrolífera francesa Elf-Aquitanie, numa clara tentativa de rechacar os interesses norte-americanos defendidos pelos regimes "democratizados".
Mas o caso mais impactante, foi o do Zimbabwe, onde em outubro de 2001 o presidente Robert Mugabe anunciou que o país abandonava a economia liberal de mercado, para adotar um padrao "socialista". Em 2002 ele apoiou as invasões de fazendas (pertencentes aos brancos) pelos antigos guerrilheiros, nos meses que antecederam as eleições, marcadas por violência, cerceamento da mídia ligada a oposição e pela presença de observadores estrangeiros. Enquanto os EUA e a Inglaterra ameaçavam o presidente que estava no poder desde 1980 e a Commonwealth suspendia o país da organização, ele venceu as eleições. Sem se intimidar, e com o respaldo de outros países africanos, especialmente da África do Sul, ele prosseguiu sua política e realizou uma ampla reforma agrária, enquanto era boicotado pelos países ocidentais.
Em fevereiro de 2000, por sua vez, um novo conflito armado ocorreu entre a Etiópia e a Eritréia. Embora o pretexto para o conflito tenha sido os litigios fronteiricos, a verdadeira razão foi o abandono unilateral pela Eritreia da União Monetária existente entre os dois países e o crescente alinhamento desta com os EUA. Posteriormente foi estabelecida uma trégua, o que também aconteceu em relação a outros conflitos. Na Somália, em outubro de 2002, as quatorze faccões assinaram um acordo de cessar-fogo, o que igualmente ocorreu entre o governo de Burundi e os rebeldes hutus. Já no Saara ocidental o Marrocos, que ocupa o país desde 1975, tem manobrado para não realizar o plebiscito sobre a independência, em atendimento a resolução da ONU. Mas o caso mais espetacular foi o fim da longa guerra civil em Angola, após a morte em combate do líder da UNITA, Jonas Savimbi, ocorrido em fevereiro de 2002. Savimbi controlava as minas de diamante do interior e devastava o país, enquanto o governo retirava seu rendimento do petróleo do litoral.
Um cessar-fogo também foi acertado na república Democrática do Congo, com a retirada das tropas de Ruanda e Uganda (que chegaram a controlar metade deste gigantesco país), e do desarmamento da maior parte dos rebeldes, embora alguns focos de conflito ainda persistam. Kabila chegou a ser assassinado no desencadeamento da guerra, sendo substituído por seu filho na presidência, e o regime resistiu devido ao apoio político-militar de Angola, Namibia, Zimbabwe e África do Sul. Este último país, por sua vez, tem emergido como a nova liderança africana, apoiando países aliados, promovendo mediações de conflitos e participando em forças de paz no continente, além de haver intervido no Lesoto em setembro de 1998, para salvar o governo que se encontrava ameaçado. Além disso, a nova África do Sul tem atuado na diplomacia mundial de forma crítica a neohegemonia americana, defendendo a construção de um mundo multipolar.

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